se quiser saber um pouco mais do mesmo, nada de novo:

A LUTA CONTRA O RACISMO, COMO FORMA DE COMBATER O CAPITALISMO


“O racismo e capitalismo são faces da mesma moeda” Steve Biko

A sociedade brasileira vive por mais de cinco séculos a experiência do capitalismo, que se alicerçou na dinâmica de divisão de classes, entre os explorados e os exploradores, os detentores dos meios de produção e os não detentores. Essa é a dinâmica que permeia a vida dos brasileiros e muitos outros povos em nossa sociedade.

Uma das propostas que se apresentam para a transformação social na superação da sociedade de classes é o socialismo, que se apresenta como modelo alternativo ao qual devemos buscar se não queremos continuar com o atual modelo.

Mas se faz necessário uma reflexão, pois ele se apresenta como uma alternativa para a transformação social, partindo do pressuposto que a sociedade capitalista se divide em duas. O que é correto, no entanto, existem grupos específicos dentro das classes, sobretudo a dos explorados, não detentores dos meios de produção, que são os negros, mulheres, indígenas, LGBT, PNE’s, entre outros, que de certa forma recebem diretamente a ação do capitalismo em suas vidas.

Como sabemos o capitalismo sempre usou a estratégia de dividir para controlar. Desta forma, uma luta anti-capitalismo que não considere as condições sócio-econômicas da posse dos meios de produção sem articular as lutas específicas; e, da mesma forma, uma luta específica que não considere a estrutura econômica que vem se perpetuando há mais de cinco séculos, também estará fadada ao fracasso, pois, como disse o grande líder Sul-africano Steve Biko “O racismo e capitalismo são faces da mesma moeda”.

É com este propósito que a UNEAFRO-Brasil (União de Núcleos de Educação Popular para Negras/os e Classe Trabalhadora), se apresenta como uma organização do movimento negro, com consciência de classe, partindo da reflexão de que a luta contra o racismo, o preconceito e todas as formas de discriminação não anula a luta contra a concentração de renda, poder e oportunidades. Ao contrário, elas se somam na busca de uma sociedade livre de injustiças sociais. Viemos para combater o racismo e as discriminações, sejam elas movidas por preconceitos étnicos, de gênero, opção sexual, idade, origem ou opção ideológica. E para superar o capitalismo, escolhemos lutar contra o racismo, usando como tática as ações afirmativas para negros e trabalhadores em geral.

Gestada durante 20 meses, entre 2007 e 2008, fundada em 5 de Março de 2009, em uma ocupação da Faculdade de Medicina da USP, a UNEAFRO-Brasil agrega militantes da causa negra, da luta anti–racista, da causa das mulheres, da diversidade sexual e do combate a todos os tipos de discriminação e preconceito; A UNEAFRO é um movimento social que se organiza em núcleos de atuação em diversas áreas. O trabalho mais conhecido são os cursinhos pré-vestibulares comunitários que atendem jovens e adultos oriundos de escolas públicas, prioritariamente negros/as, que sonham em ingressar no Ensino Superior e preparar-se para o ENEM ou Concursos Públicos. Atualmente, nos organizamos em 42 núcleos, espalhados por 14 cidades do Estado de São Paulo.

Uma marca do movimento social dos cursinhos comunitários e da UNEAFRO são as aulas de “Cultura e formação política”. O foco didático-pedagógico desta disciplina, baseado na abordagem transversal de conteúdos sociais e étnico-raciais, busca trabalhar os temas diferentes métodos, através de palestras, dinâmicas, filmes, teatro e seminários em grupo. Há nas aulas e atividades formativas de nossos núcleos um propósito de combater o automatismo da educação preparatória para o vestibular, desprovida de criticidade ou leitura do mundo onde está inserido o educando.


O diálogo constante com a comunidade permite aos educadores reelaborarem o enfoque dado aos temas e atualizarem informações com interação com as disciplinas tradicionais. A formação politizada, popular e diferenciada dos modelos tradicionais torna-se desafio de todo corpo docente. Os cursinhos pré-vestibulares e os demais núcleos de base cumprem o papel, de levar para a sala de aula e para parcela da população da periferia a oportunidade de aprofundar temas próprios de sua realidade e provocar ações de visem mudança. Brota ali a teoria socialista, a partir da luta concreta da juventude, dos negros, mulheres, desempregados, de toda classe trabalhadora reunida no núcleo, o nosso quilombo.

E uma das formas de lutarmos é através de adoção de ações afirmativas e cotas, em todos os espaços de poder, principalmente nas Universidades. Outra forma que utilizamos para combater as discriminações é por meio da organização comunitária, em núcleos de base, educação popular, formação política, intervenção cultural ou prática de esportes.
Nossa luta não é apenas por cotas, bolsas estudos, educação ou emprego! Temos a consciência que a nossa luta é maior. Sonhamos com uma nova sociedade! Queremos a transformação social! Um caminho para que tenhamos mais força para a grande revolução, é o fortalecimento das lutas do povo, como forma de reparação das injustiças cometidas pela escravidão, pela Igreja, pelo latifúndio, pelo mercado de trabalho, pelo racismo e a subversão da lógica imposta pelos meios de comunicação de que cada um deve lutar sozinho pelo seu próprio espaço.

Na questão das ações afirmativas, um ponto polêmico refere-se a sua dimensão socioeconômica. Neste assunto, há o entendimento conforme se segue:

“A importância das políticas de ações afirmativas está no fato de que são políticas materiais de reparação e de redistribuição que estabelecem uma recomposição do social, do econômico, do político e do cultural, pois abalam estruturas constituídas e naturalizadas da sociedade. As políticas de cotas inserem-se nesta lógica, pois abalam o valor do mérito interiorizado em todos nós. Ora, o que define mérito é merecimento e não competência. Partilhar os bens sociais baseados no merecimento individual é tentar privilegiar igualmente indivíduos em situação de desigualdade.”[1]


E como disse uma dos maiores intelectuais brasileiros, Caio Prado Jr em sua obra “A revolução brasileira”:

“[...] a diversidade da realidade brasileira, assim como os aspectos culturais, de modo geral, não são considerados pela esquerda brasileira. Esse desconhecimento cria obstáculos para a unificação das forças, na medida em que o discurso da vanguarda revolucionária não sensibiliza outros grupos subalternos, e que, com isso, não criam uma base social hegemônica [...]” (PRADO, 1972, p. 20)

É com essa interpretação das palavras de Caio Prado Jr. e de outros intelectuais, como Florestan Fernandes e Clovis Moura, que afirmamos que a questão do racismo esta umbilicalmente ligada com a questão da luta de classes no Brasil, porque o capitalismo brasileiro foi edificado com base na acumulação primitiva de riquezas construída com a exploração da mão de obra de africanos escravizados.
Além disto, a geopolítica do capitalismo mundial se organizou com base no controle do tráfico de escravos (feito pela Inglaterra) e pela intermediação dos produtos produzidos com a mão de obra escrava, como o açúcar (também feito pela Inglaterra). Assim, este dado histórico selou a hegemonia européia e a ruína da África e da América Latina em função da concentração das riquezas no primeiro continente, no despovoamento e saque da África e do saque de riquezas e recursos da América Latina. Por isto, a emancipação do negro e do continente africano e latino-americano só será possível com uma brutal transformação no sistema social e, principalmente, na redistribuição das riquezas.

Não há como lutar contra o racismo e conceber a continuação das explorações decorrentes do sistema capitalista e neoliberal. Da mesma forma, não há como lutar por uma nova sociedade, sem explorações e sem concentração de renda, se não lutarmos contra o racismo. É nesse sentido que defendemos de forma incondicional Ações Afirmativas para negros e pobres, como ferramenta de combate à concentração de renda e meio de empoderamento daqueles que foram os mais prejudicados pelo sistema capitalista, que são os herdeiros de Zumbi e Dandara! Axé! Por uma nova sociedade!


Conselho Geral da UNEAFRO-Brasil
(
União de Núcleos de Educação Popular para Negras/os e Classe Trabalhadora)


Bibliografia:

NASCIMENTO, Alexandre do. O Programa Diversidade na Universidade e a construção de uma política educacional anti-racista. Brasília, UNESCO, 2007.

PRADO Jr., Caio. A revolução brasileira. São Paulo, ED. Brasiliense, 1972,4ª ed.;



Manifesto pelo início da construção da UNEAFRO-Brasil

Manifesto pelo início da construção da União de Núcleos de Educação Popular para Negras/os e Classe Trabalhadora

*UNEAFRO*


São Paulo, das dependências da Faculdade de Medicina da USP, 05 de Março de 2009.


Nós, negras/os, não-negras/os pobres, jovens, mulheres, pne’s, idosos/as, estudantes de escolas públicas, universitárias/os, professores/as, educadores/as populares e militantes de diversos movimentos sociais, que ousamos acreditar num país justo, igualitário, livre da exploração promovida pelo sistema capitalista e, sobretudo, sem racismo, manifestamo-nos neste dia 05 de Março de 2009, pelo início da construção da UNEAFRO – União de Núcleos de Educação Popular para Negras/os e Classe Trabalhadora.


Surgimos a partir de uma dissidência da Educafro. Ajudamos a construir o que já foi uma importante ferramenta da luta do povo negro, da juventude e da educação brasileira. Enquanto membros daquela organização pautamos os poderes públicos, universidades, empresas privadas e o setor educacional. Ações Afirmativas e Cotas para negros, indígenas e pobres tomaram corpo de política pública, transformaram-se em leis ou regras autônomas em universidades. Temos convicção de que nossa atuação contribuiu para transformação da vida de milhares de pessoas que buscaram, com dignidade, ocupar espaços historicamente negados à população empobrecida, em especial aos descendentes africanos.


Nos últimos três anos, enquanto ajudamos a conduzir os rumos da Educafro, democratizamos as relações internas, efetivamos a construção coletiva da linha de atuação política e, em especial, priorizamos a formação crítica de viés anti-capitalista e anti-racista. Neste período levamos com intensidade a luta do negro para todas as dimensões da luta popular, obedecendo a compreensão de que a luta contra o racismo e por Cotas/Ações Afirmativas precisa estar aliada à luta social mais ampla, contra as super-estruturas que geram as desigualdades.

Através de dezenas de encontros de formação e em dois encontros deliberativos (Retiros/Congressos de Sumaré e Guararema), a Educafro reivindicou-se como um movimento social do povo negro, democrático, combativo e de luta. Infelizmente, tal condição foi sumariamente negada pela recém reempossada direção. A inviabilidade da continuação do projeto popular, democrático e de luta no seio daquela entidade nos levou a aceitar o desafio da construção deste novo movimento.


Neste momento novo, de superação da experiência da Educafro, propomos a retomada do caminho de luta, calcada nas bases da organização comunitária; da provocação à autonomia dos núcleos; da formação crítica de atores sociais que buscam o rompimento com o sistema político-econômico que só privilegia o mercado e com todos os tipos de preconceito, em especial com o racismo; da busca de uma educação popular e libertadora e da prática da democracia na construção das ações.


A UNEAFRO agrega militantes da causa negra, da luta anti–racista, da causa das mulheres, da diversidade sexual e do combate a todos os tipos de discriminação e preconceito; da causa da Educação Popular e Libertária, da disseminação do protagonismo comunitário e da luta contra a exploração econômica e a dominação política. Nossa vivência nos leva a defesa da tese de responsabilização e da cobrança do Estado pelas mazelas do povo brasileiro, em especial negras/os e pela implementação de Ações Afirmativas dirigidas aos grupos historicamente injustiçados. Reivindicamos nossa vocação para o trabalho educacional de base e de formação política direcionado às comunidades periféricas urbanas; nossa atuação política no interior das Faculdades e Universidades e ações de mobilização estudantil.


A partir da vivência destes 11 anos de organização e articulação de centenas de núcleos de cursinhos comunitários, bem como da atuação e construção política na defesa da educação e da luta contra o racismo, são elementos fundantes da UNEAFRO:


1 - Luta incessante contra o racismo estrutural brasileiro em todas as suas vertentes e dimensões e da defesa dos direitos humanos e constitucionais; responsabilização do Estado brasileiro pelas mazelas sofridas por negras/os e não negras/os pobres e defesa intransigente de políticas públicas de ação afirmativa, entre elas o sistema de cotas para negras/os nos diversos espaços sociais;


2 – Fortalecimento da aliança entre o movimento anti-racista e movimentos anti-capitalistas e classistas, bem como uma maior integração da questão da/o negra/o nas diversas frentes como a luta por igualdade de gênero, acesso ao judiciário, condições de trabalho e moradia nas cidades, reforma agrária, contra a exploração das multinacionais e pela soberania nacional;


3 – Exercício permanente da organização comunitária, tanto através dos já tradicionais cursinhos pré-vestibulares comunitários ao valorizar regionalmente sua atuação, quanto da organização cultural, esportiva ou de grupos e intervenção política local. Nossos núcleos serão mais que espaços de necessário estudo acadêmico. Sobretudo deverão constituir-se em opções para formação teórica e construção de lutas sociais concretas.

4 – Defesa intransigente da educação pública, popular, gratuita e de qualidade, casada à defesa das Ações Afirmativas e Cotas para a população negra em universidades; Exigência de aumentos substanciais nos investimentos para a Educação, desde o ensino fundamental, até a ampliação das vagas em universidades públicas, além do permanente questionamento ao modelo de acesso via vestibular; Defesa da valorização do profissional da Educação e por uma política pedagógica voltada para a realidade das comunidades. Nossos núcleos em sua prática pedagógica combaterão o automatismo da educação preparatória para o vestibular, desprovida de criticidade ou leitura de mundo onde está inserido o educando.


5 – Incentivo à criação e disseminação de veículos de comunicação alternativos, uma vez que um dos maiores desafios para aqueles que se dedicam à educação popular é justamente furar o enorme bloqueio midiático que banaliza a organização popular e infunde na opinião pública uma aversão a todos os grupos que questionam as estruturas de poder, cumprindo, assim, tarefas históricas para a elite deste país.


6 – Compromisso com a horizontalidade nas relações núcleos/movimento. Uma vez que esta organização se configura como uma união dos núcleos de base, faz-se princípio em nosso cotidiano e relação interna o mesmo que cobramos da sociedade como um todo: o exercício permanente da construção e deliberação coletiva da linha de atuação política, institucional e dos rumos desta organização.


Por fim, não há como deixar de lado a imensa contribuição dada por outros tantos companheiras/os que, individualmente, foram voz discordante e dissidente e que buscaram outros caminhos para sua atuação política. Este Manifesto surge como um chamado aos diversos grupos urbanos organizados ligados a cultura, ao esporte, a grupos de estudo e de educação alternativa, autônomos, independentes, bem como universitários pagantes, inadimplentes, bolsistas, cotistas e prounistas. Este é o momento.


A UNEAFRO é um movimento aberto ao diálogo, que propõe e não impõe idéias, mas não abre mão de endurecer para se fazer ouvido toda vez que esse direito for negado.


Que o exemplo revolucionário de Dandara, Zumbi dos Palmares, Anastácia, Antonio Conselheiro, Luiza Mahin, Che Guevara, Malcolm X e tantos outras/os inspire nossa luta!


Surge uma nova trincheira!

Comunicam sua saída da Sede

Aos Companheiros e Companheiras dos Núcleos e Universidades:

Comunicam sua saída da Sede da Educafro:


Heber - Coord. Geral,
Douglas - Coord. Político,
Vanessa - Coord. Adm,
Jorge - Jornalista,
Adriano - Coord. Pedagógico,
Cleiton Meneses – Assistente SeUni,
Cleyton Borges – Coord. SeNuc/Jurídico,
Nádia – Assistente SeNuc,
Flávio – Assistente SeUni,
Maíra - Assistente SeUni,
Juliana – Núcleo de Mulheres Negras,
Lorena Bonfim - Núcleo de Mulheres Negras,
Suellen - Assistente Adm,
Débora – Assessora Pedagógica
Noemy - Assistente SeNuc,
Jarlene – Estagiária/ Núc. Mulheres Negras,
William - Assistente SeUni,
Thayan - Assistente Seppaa,
Vinícius – Manutenção de rede,
Amanda - Assistente Adm.


Com respeito e humildade, informamos e justificamos, por esta carta, nossa decisão de sair da Direção e dos trabalhos da Sede da Educafro, por não concordar com o método e modelo de gestão impostos por Frei David. Nossas discordâncias são principalmente de cunho ideológico.

Nesses anos de construção da Educafro , várias pessoas se destacaram, entre elas Frei David, que foi o fundador e um dos que se dedicou radicalmente a essa causa. Prova disso foram os acontecimentos no Senado entre os meses de novembro e dezembro de 2008.

No entanto, milhares de pessoas (em centenas de núcleos) também se doaram radicalmente para que a Educafro fosse hoje o movimento de vanguarda que é. Entre estas pessoas, estamos nós ex-integrantes/dirigentes da Sede.

A decisão da saída de todo o grupo é fruto de situações acumuladas nestes anos, de conflitos ideológicos com Frei David e seu método de trabalho. A cada ciclo, outros companheiros(as) tomaram a mesma decisão de maneira individual.

Com o deslocamento de Frei David para Santa Catarina, no início de 2007, a Sede permaneceu sem sua figura mais emblemática ou contou com sua atuação à distância. Ele carrega consigo, além dos inquestionáveis talentos e liderança, vícios como a centralização, o apego a hierarquia nas relações e visão de que a democracia e os embates de idéias causam os conflitos ou divisões de poder.

A partir de 2007, sempre ao lado dos frades sucessores (Frei Antônio Leandro e Frei Valnei Brunetto), estabelecemos uma nova dinâmica no relacionamento entre Sede – Núcleos – Bolsistas. A democratização das relações norteou os trabalhos. Citamos por exemplo a prioridade dada à formação cidadã; encontros com universitários; o resgate do Conselho Geral da Educafro (CGE) formado por 10 coordenadores(as) eleitos(as); aproximação com o movimento negro e atenção às linhas políticas propostas pelos Sefras. O que fizemos nestes últimos dois anos foi motivar e valorizar o protagonismo das pessoas que "fazem a Educafro em sua essência". Tudo isso está registrado nas publicações.

Levamos com intensidade a luta do negro para todas as dimensões da luta popular. Compreendemos que a luta contra o racismo e por Cotas/Ações Afirmativas precisa estar aliada à luta social contra as estruturas que geram todas as desigualdades do mundo capitalista. Há muitas discordâncias com Frei David neste aspecto político.

Desde seu retorno ocorreram tentativas de conciliação, porém, percebemos a incompatibilidade entre o que acreditamos e sonhamos, com a prática trazida de volta por Frei David. Infelizmente, ele e seu futuro corpo funcional deverá passar por cima da construção democrática e da horizontalidade dos últimos dois anos. As decisões tomadas coletivamente em nossos Retiros de Sumaré (2007) e Guararema (2008) serão rechaçadas.

Nossa formação contestadora e nosso compromisso com a luta popular e com a causa do negro não nos permitem renegar a construção coletiva e o diálogo. Entendemos que o poder, tanto na Educafro como em qualquer movimento de massa, já é naturalmente dividido por todos os que deste movimento participam. O povo da Educafro ganha ao avaliar o caráter pedagógico, construtivo e provocador de nossa saída.

A Educafro é o povo que se organiza de maneira autônoma, pura de coração, singela e resistente nos núcleos. Sem os núcleos e o sem os milhares de militantes que os organizam, não existe Educafro. É necessária e urgente a valorização de quem efetivamente constrói o movimento.

Agradecemos aos companheiros/as de outras lutas e aos frades da Província Franciscana, continuadores da obra de Francisco de Assis, que por inúmeras ocasiões nos receberam e apoiaram durante esses 10 anos. Reivindicamos São Francisco de Assis, em seu desprendimento!

São Paulo, 23 janeiro de 2009.

Permaneceremos nesta luta, com mais ânimo,

com mais força e com muito axé!

Organize-se e lute!

Uma nova cara para a universidade brasileira?

Câmara aprova cotas sociais e étnico-raciais. "Vencemos mais uma primeira batalha!"

Vivas à luta do povo organizado! Salve Zumbi e Dandara! O dia 20 de Novembro de 2008 pode entrar para a história. No momento em que militantes de todo o país celebravam o Dia da Consciência Negra, a Câmara dos Deputados aprovava o projeto de lei que reserva 50% das vagas das universidades federais para estudantes de escolas públicas. Parte dessas vagas serão ocupadas por negros e indígenas, de acordo com a proporção étnica de cada estado identificada pelo censo demográfico. A Lei depende de aprovação no Senado.


Um detalhe importante, considerado por muitos como fator altamente positivo, é o artigo que garante recorte sócio-econômico na política de cotas (renda per capta até 1,5 salário mínimo) e exigência aos candidatos de terem cursado todo ensino médio em escola pública! A política de cotas é uma reivindicação histórica do Movimento Negro, que se tornou mais intensa a partir do trabalho desenvolvido pela Educafro e outros movimentos nos últimos anos.


Vencemos mais uma primeira batalha! A aprovação das cotas é resultado da organização popular, da pressão intensa por meio de manifestações, seminários, abaixo-assinados e audiências públicas. Mais do que isso, é fruto do amadurecimento político e social em torno de ações afirmativas como instrumento de transformação social e redução das desigualdades entre negros e brancos.

A Educafro defende as políticas de ações afirmativas, como as cotas nas universidades públicas, sem desconsiderar a necessidade de se fazer investimentos maciços no ensino básico e também políticas de permanência no ensino superior. Há seis anos, desde quando a Educafro intensificou a luta por cotas, entendemos ser necessária a valorização de todos os níveis educacionais. Investir na escola pública não contradiz a luta por cotas. São causas que se somam. Por outro lado, não se pode culpar apenas a defasagem do ensino público pela ausência de negros e pobres no ensino superior. O vestibular é essencialmente excludente e deve ser questionado também. O modelo ideal de vestibular seria aquele que capacidade, vocação e talento dos candidatos e não somente que teve mais acesso à fórmulas e macetes. Caso o Senado Federal também aprove o projeto de lei, as universidades federais terão um prazo de quatro anos para fazer as adequações necessárias.

Por enquanto, a aprovação na Câmara dos Deputados é simbólica, visto que ainda dependemos da aprovação dos senadores. Esperamos que todos os partidos, tanto da base governista, como da oposição, de direita ou de esquerda, mantenham no Senado a mesma postura da Câmara. Só teremos motivos para comemorar quando a lei for sancionada pelo Presidente Lula.


Nos próximos dias a Educafro iniciará uma mobilização de sua base (184 núcleos de cursinhos comunitários em Sâo Paulo) visando a aprovação do Projetos também no Senado!

Teoria e prática contestatória, reflexiva e transformadora


O estudo da disciplina 'Cultura e Cidadania' nos cursinhos comunitários da Educafro: teoria e prática contestatória, reflexiva e transformadora


O que diferencia a Educafro dos outros cursinhos são as aulas de “Cultura e Cidadania” desenvolvidas regularmente em cada núcleo de pré-vestibular comunitário, com carga horária igual ou superior às disciplinas acadêmicas como física, história, português ou biologia. As aulas de cidadania se caracterizam em uma marca do projeto e abordam 10 temas anuais, especialmente selecionados e preparados para a realidade dos alunos provenientes das escolas públicas e do povo negro. Esta é uma herança do PVNC – movimento dos Pré-vestibulares para Negros e Carentes, nascido no Rio de Janeiro na década de 90, anteriormente à Educafro.

O foco didático-pedagógico desta disciplina, baseado na abordagem transversal de conteúdos sociais e étnico-raciais, busca trabalhar os temas com diversidade, através de palestras, dinâmicas, filmes, teatro e seminários em grupo, passando pelas vertentes teóricas e práticas do que representa o termo cidadania para a Educafro. Trata-se pois de um exercício permanente de formação política dirigida a seus participantes diretos (público interno) e indiretos (comunidade do entorno dos núcleos), que se constrói não só nos núcleos, mas em encontros mensais com os professores da área, dirigidos pela Sede da Educafro.

É através das aulas de 'Cultura e Cidadania' que se apresenta aos futuros universitários bolsistas o compromisso ou contrapartida social que terá para com o seu núcleo de origem. Este compromisso diz respeito à participação em eventos, trabalho comunitário (aulas, orientação vocacional ou apoio à coordenação), atos públicos, colaboração financeira simbólica para sustentabilidade da Educafro, aproveitamento acadêmico e formação política permanente, durante o curso de graduação.

Com este trabalho, tanto teórico como prático, busca-se transformar os núcleos em espaços de partilhas metodológicas de experiências pedagógicas, culturais, políticas e sociais. O trabalho em rede incentiva encontros regionais que identificam demandas e bandeiras de lutas locais sem, ao mesmo tempo, se isolar ou perder a perspectiva de movimento coletivo com representação nacional.

Neste contexto inseres a disciplina 'Cultura e Cidadania', cujo conteúdo programático é único para os núcleos de todas as regiões. São exemplos de alguns temas estudados nos núcleos nesta disciplina, os quais o autor teve a experiência de contribuir para a elaboração e o desenvolvimento:

* Violência doméstica e de gênero: um olhar para a mulher afro-brasileira.
* O negro e a mídia: reflexões sobre comunicação de massa e a população Afro-brasileira.
* Quais são os meios disponíveis para a aplicação da lei 10.639 e torná-la efetivada em todos os níveis de ensino?
* Ensino Superior no Brasil, reforma universitária e seus desafios.
* Desenvolvimento sustentável: é possível o Brasil crescer sem destruir o que resta da Amazônia?
* Povos indígenas: sua história e situação atual.
* Criminalização de movimentos sociais e repressão do Estado.
* Saúde da mulher negra e gravidez na adolescência: o que todos/as deveriam saber e fazer?
* O terceiro setor frente a um Estado omisso: substituir ou pressionar?
* Direitos humanos para quem? Raça e justiça no Brasil!
* Violência policial e questões relacionadas a segurança pública.

Com esta prática, os cursinhos comunitários desenvolvem também conteúdos de história da África e cultura afro-brasileira. Por pressão do movimento negro organizado, esta política tornou-se recentemente obrigatória no ensino fundamental e médio, com a Lei 10.639/03.

Os temas são escolhidos através de indicação dos membros dos núcleos (professores, universitários, alunos e coordenadores) e votação em assembléia. O planejamento e a avaliação este trabalho também é feito por meio dos encontros mensais de treinamento e capacitação com professores voluntários, quando são elaborados textos-base referentes aos temas de cidadania de cada semestre. O objetivo destes textos é dar início ao trabalho nos núcleos, que deverá ser complementado com outras abordagens.

O diálogo constante com a comunidade, permite aos educadores de 'Cultura e Cidadania' reelaborarem o enfoque dado aos temas e atualizarem informações com interação com as aulas de História, Redação, Língua Portuguesa e Atualidades. Publicações jornalísticas e artigos de opinião são também objetos de estudo. Também os professores de disciplinas meramente acadêmicas, como Biologia ou Matemática, em muitas situações são desafiados a interagir com o conteúdo de 'Cultura e Cidadania'. A formação politizada, popular e diferenciada dos modelos tradicionais é, por assim dizer, em alguns casos, desafio de todo corpo docente voluntariado.

Em sua organização interna, a Educafro se estrutura através de núcleos de base. É característica marcante dos núcleos de pré-vestibular comunitários da Educafro, a inserção e o diálogo permanente na comunidade local periférica, uma vez que utiliza espaços de uso público, otimizando-os (salões de igrejas, escolas públicas, associações de moradores, salas de sindicatos, centros de defesa de direitos, etc).

Nos últimos anos, inserção do discurso étnico-racial passou de elemento complementar a ocupador de foco central da entidade, fato notadamente difundido entre grupos sociais afins, universidades, órgãos de imprensa e acadêmica especializada no assunto.

No processo de seleção de bolsas de estudo é aplicada uma ação afirmativa da entidade, modo que é acrescida a pontuação de negros e indígenas na classificação para obtenção das bolsas. O objetivo deste favorecimento é ajudar a corrigir as grandes distorções criadas pelas desigualdades que vigoram em nosso país. Esta problemática, envolvendo a discriminação positiva para os participantes dos cursinhos, nem sempre é pacífica ou ausente de polêmica. Ao contrário, traz à tona uma constante necessidade de estudo, debate e conscientização. O conteúdo desta contradição e conseqüente aprofundamento aos temas étnico-raciais são tratados na Educafro através de momentos vivenciais como manifestações públicas, protestos e dinâmicas em grupo.

Nos encontros formativos para professores de cidadania, é refletido que a proposta educacional da Educafro contempla de modo interativo aprendizados teóricos e atividades práticas relacionados à defesa da cidadania e conscientização anti-racista, inclusive com filme, convidados especialistas e cursos livres.

A formação de professores dessa área induz a multiplicar lideranças que entendam ser as aulas da disciplina "cultura e cidadania" mais que momentos de formação, também uma preparação para questões cotidianas orientadas pela Sede da Educafo, no tocante à questões sociais, sobretudo étnico-raciais, na faculdade, vida social e mercado de trabalho.

Os núcleos constituem-se ambiente propício para que o cidadão comum exerça seu papel político em sua comunidade. Busca-se, desse modo, ampliar o olhar macro sobre as realidades e qualificar a ação no seu micro espaço. Partindo da realidade local, provocam mutirões de solidariedade e trabalho voluntário de agentes locais, ajuda mútua entre os participantes, auto-conhecimento enquanto grupo social ativo, protagonismo, conscientização para a questão étnica e oportunidade de convívio com a diversidade (étnica, de gênero, idade e orientação sexual). Como dito anteriormente, é local propício para a formação política teórica e prática, fomento para surgimento de novas lideranças comunitárias, resgate de auto-estima, reforço de laços de afetividade, celebração espontânea das vitórias e cultivo da mística.

Um país fraterno, na acepção franciscana, diverso e sem racismo, na perspectiva do movimento negro e sem desigualdades sociais, como buscam os movimentos sociais, é o que se espera construir no longo caminho ainda a se percorrer na luta da Educafro.

Vestibular de Cultura e Cidadania? Que é isso?

Este é o décimo primeiro ano que fazemos. Mas realmente é uma idéia ainda nova. Não se pautar por quem decora macetes... quem paga... ou quem teve mais acesso a conteúdos descartáveis, típicos do vestibular da Fuvest e outros por aí que não aferem capacidade. O Vestibular de Cultura e Cidadania da Educafro avalia 3200 estudantes de escolas públicas e identifica qualidades outras, como militância, consciência crítica, formação política, disposição para vencer, superação de dificuldades, enfim, encontra talentos que as universidades não encontram.

Diferente dos vestibulares tradicionais, como o da FUVEST, conteúdo cobrado privilegia potencial e não o mérito;

Por Jorge Américo: Neste final de semana, 18 e 19 de outubro, 3200 estudantes, vindos de 49 municípios, fizeram o “Vestibular de Cidadania da Educafro”. A avaliação é parte de um programa de ação afirmativa que ofertará, neste ano, 850 bolsas de estudos parciais e integrais em nove instituições de Ensino Superior. A coordenação informou que a prova foi totalmente digitalizada para que os alunos começassem a se habituar ao uso do computador, visto que muitos ainda vivem em situação de exclusão digital.
A pontuação obtida pelos candidatos não é garantia de conquista do benefício. Outros critérios também são analisados. As mulheres, negros e PNEs são priorizados. A idade (quanto mais avançada, maiores as chances), a situação sócio-econômica e o envolvimento com trabalhos voluntários também ajudam na colocação. Busca-se, assim, atender àquelas pessoas que são barradas em maior proporção pelos atuais mecanismos de acesso à universidade.
Aparecida Gisele dos Santos, 33, terminou o Ensino Médio há 15 anos e só agora pôde retomar os estudos. “Como meu marido está desempregado, acabei me tornando ‘chefe-de-família’. Tenho dois filhos e não posso pagar a mensalidade de uma faculdade particular. Pretendo cursar Direito e a única maneira que vejo de realizar este sonho é através de uma bolsa de estudos”.
O “Vestibular de Cidadania da Educafro” possui características diferentes dos vestibulares tradicionais, como o da FUVEST. Isso porque os conteúdos meramente acadêmicos não tocam no cerne das questões que rodeiam e angustiam a juventude, principalmente aquela inserida em bairros periféricos, onde a presença do Estado é cada vez menor. “Nossa prova é um exemplo de inclusão pedagógica, popular e cidadã. As questões visam continuar o processo de aprendizagem que é desenvolvido em sala de aula. É uma forma de aprender na prática”, explica Adriano Rodrigues, coordenador pedagógico da Educafro.
Cleyton Borges, da coordenação do vestibular revela que o conteúdo cobrado privilegia o potencial e não o mérito. “Enxergamos como sendo mais importante a capacidade de reflexão e não apenas a de assimilação. As questões são elaboradas com base em temas étnico-raciais e contemplam a conjuntura política, econômica e social do país”. Segundo Borges, há uma sintonia com a Lei 10.639/03 (alterada pela Lei 11.645/08), que torna obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas de Ensino Fundamental e Médio.
Desde o surgimento dos primeiros cursinhos comunitários, na década de 80, a disciplina de “Cultura e Cidadania” é parte estrutural da grade pedagógica nos núcleos da Educafro. “A formação política e cultural permeia as demais disciplinas, o que permite construirmos uma base sólida na busca do conhecimento emancipatório e da transformação social”, diz Frei Valnei Brunetto, diretor-executivo da Educafro.
Suellen Marques fez o Vestibular de Cidadania há quatro anos e hoje é bolsista no curso de Administração. Faz parte do grupo de 100 voluntários que se revezaram entre sábado e domingo últimos para cuidar da infra-estrutura e recepção dos candidatos. “As semanas que antecederam o exame exigiram um esforço dobrado. Viramos a noite várias vezes cuidando dos detalhes”.

Quer saber mais? Fale com a gente.

Militar condenado e declarado torturador

Um grande passo na luta por Justiça
Carlos Alberto Brilhante Ustra, coronel reformado do Exército, foi responsável pela tortura dos integrantes da família Teles, durante a ditadura civil militar (1964-1985). Assim entende o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que hoje (9), expediu sentença em que julga procedente o pedido de declaração de responsabilidade de Ustra pela tortura dos ex-presos políticos Maria Amélia de Almeida Teles (Amelinha), César Augusto Teles e Criméia Schmidt de Almeida, que sofreram os abusos no DOI-Codi paulista, nos anos 1970, na época, sob o comando do coronel. Para Aníbal Castro de Souza, que, juntamente com o jurista Fábio Konder Comparato representa os Teles, a decisão do TJ representa uma grande esperança e uma grande vitória para a democracia. "O Brasil, por intermédio do Poder Judiciário reconheceu o direito à verdade acerca do ocorreu efetivamente nos "anos de chumbo". Com isto, consolida a democracia para que todos saibam que ninguém pode agir à margem da lei. A lei de anistia não pode ser um escudo contra impunidade daqueles que desonraram as Forças Armadas", afirmou. Castro comemora a decisão inédita da Justiça brasileira. "Pela primeira vez na história do país, houve o reconhecimento judicial e, portanto, oficial, do Estado brasileiro de que um militar de alta patente teve participação efetiva em torturas contra civis. "Já houve outras decisões reconhecendo indenizações a pessoas torturadas, mas todas eram contra a União Federal enquanto ente jurídico", afirma. Nós que lutamos por Justiça, nos sentimos contemplados com esta decição histórica! Atualmente Amelinha é ativista da causa feminista, na União de Mulheres e PLP - Promotoras Legais Populares.

Vencemos: a homenagem aos que só sobrevivem da Opressão

A gente estuda Bertold Brecht:
Nada é impossível de mudar

"Desconfiai do mais trivial,
na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,
pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar."


A gente ouve Taiguara:

Que as Crianças Cantem Livres

"O tempo passa e atravessa as avenidas
E o fruto cresce, pesa e enverga o velho pé
E o vento forte quebra as telhas e vidraças
E o livro sábio deixa em branco o que não é
Pode não ser essa mulher o que te falta
Pode não ser esse calor o que faz mal
Pode não ser essa gravata o que sufoca
Ou essa falta de dinheiro que é fatal
Vê como um fogo brando funde um ferro duro
Vê como o asfalto é teu jardim se você crê
Que há sol nascente avermelhando o céu escuro
Chamando os homens pro seu tempo de viver
E que as crianças cantem livres sobre os muros
E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor
E que o passado abra os presentes pro futuro
Que não dormiu e preparou o amanhecer..."




a gente lembra Guevara

Carta aos filhos:
"Queridos Hildita, Aleidita, Camilo, Célia e Ernesto:


Se alguma vez tiverem que ler esta carta, será porque eu não estarei mais entre voçês.
Quase não se lembraram de mim e os mais pequenos não recordarão nada.
O pai de voçês tem sido um homem que atua, e certamente, leal a suas convicções.
Cresçam como bons revolucionários.
Estudem bastante para poder dominar as técnicas que permitem dominar a natureza.
Sobretudo, sejam sempre capazes de sentir profundamente qualquer injustiça praticada contra qualquer pessoa em qualquer parte do mundo.
Essa é a qualidade mais linda de um revolucionário.
Até sempre, meus filhos. Espero vê-los, ainda. Um beijão e um abraço do Papai."

Che

É preciso tapar os buracos dos ratos

Rubem Alves nos dá essa aula sobre eleições e poder

O nome do filme, acho que era “Queijo Suíço“. O Gordo e o Magro estavam sem emprego. Precisavam ganhar dinheiro. Ouviram que a Suíça era um país famoso pelos seus queijos. Pensaram: “Se na Suíça há muitos queijos é lógico que lá deverá haver muitos ratos. Mas ninguém gosta de ratos. E, em especial, os fabricantes de queijos devem odiar os ratos. Se não gostam dos ratos é lógico que a Suíça deve ser um excelente mercado para matadores de ratos.“ Tomaram, então, uma decisão: “Vamos matar ratos da Suíça“.Puseram-se, então, a pensar sobre a tecnologia adequada para matar ratos. Consultaram a bibliografia disponível. Leram sobre um famoso matador de ratos imortalizado pela literatura: um flautista! Aconteceu na cidade de Hamelin que havia sido tomada por milhões de ratos. Eram tantos que gatos e ratoeiras eram inúteis. Pois o dito flautista se livrou deles de uma forma insólita: pôs-se a tocar uma flauta e os ratos, amantes da música, foram hipnotizados, saíram de seus buracos e puseram-se a segui-lo por onde ia. Ele, então, simplesmente entrou no rio que passava pela cidade tocando sua flauta. Os ratos, esquecidos de que não sabiam nadar, entraram também no rio, foram levados pela correnteza e morreram.Mas o Gordo e o Magro não sabiam tocar flauta. Assim, deixaram de lado essa tecnologia musical. Pensaram em usar ratoeiras para matar os ratos. Mas os ratos são espertos. Logo eles aprendem sobre as ratoeiras e não mais caem na armadilha mortal. Examinaram, depois, a possibilidade de usar gatos. Mas os gatos logo se tornam um problema. Multiplicam-se com rapidez idêntica à dos ratos e tornam-se uma peste pior que os ratos, tal como aconteceu no palácio do rei. Além disto, depois de comer todos os ratos a fome dos gatos não cessa e eles passam então a devorar pássaros, que todos amam por sua beleza e canto. Na ausência dos ratos, sabiás, pintassilgos, canários, rolinhas, pombas e curruiras passam a ser a comida diária dos gatos.Descartadas flautas, ratoeiras e gatos, o Gordo e o Magro pensaram: é tolice tentar acabar com os ratos depois que eles entram no quarto dos queijos. O certo é impedir que eles entrem no quarto dos queijos. Mas eles só entram no quarto dos queijos se houver buracos. Ora, se os buracos forem tampados eles não poderão entrar. Não entrando, os queijos não serão comidos. Concluíram, então, que a eliminação científica dos ratos se consegue por meio de uma técnica baseada na dialética entre buracos abertos e buracos tampados.Munidos dessa nova técnica bateram à porta da primeira fábrica de queijos e ofereceram seus serviços. O dono ficou encantado porque havia muitos ratos a comer os seus queijos. O Gordo e o Magro se puseram a trabalhar. A primeira coisa que fizeram foi tirar de sua caixa de ferramentas uma pua grossa com a qual fizeram um buraco redondo no assoalho do depósito dos queijos. O dono da fábrica lhes perguntou: “Para que esse buraco?“ Responderam: “Para os ratos passarem!“ A seguir, tiraram da mesma caixa de ferramentas um tarugo de madeira com o qual tamparam o buraco que haviam feito. “Para que esse tarugo de madeira no buraco?“ perguntou de novo o dono da fábrica. E eles responderam: “Para os ratos não passarem...“Não me lembro do final do filme. Mas sei que o Gordo e o Magro estavam certos: para acabar com os ratos é preciso tampar os buracos por onde entram.Aí eu me perguntei: “Mas quem é que faz os buracos pelos quais os ratos entram no quarto dos queijos?“A resposta é simples: os ratos entram no quarto dos queijos porque nós, cidadãos, fazemos os buracos. Os ratos estão lá por culpa nossa. Os buracos através dos quais os ratos entram são os nossos votos. Os ratos entram no quarto dos queijos democraticamente...É fácil fazer um regime com votos e eleições. Votos e eleições dão a impressão de democracia... Mas não bastam para impedir a invasão dos ratos. Votos e eleições são apenas meios - necessários mas não suficientes - para que a democracia aconteça. A democracia se assemelha a uma obra de arte. Tome a Pietà, por exemplo. Ela não é o resultado de cinzéis e martelos, embora cinzéis e martelos tenham sido usados por Michelangelo para esculpi-la. Mas, antes que cinzéis e martelos fossem usados, foi necessário que a idéia da Pietà tivesse surgido na cabeça de Michelangelo. Os cinzéis e martelos foram apenas os meios usados pelo artista para realizar sua idéia. Assim é a democracia: ela é uma obra de arte coletiva. Começa com as idéias do povo. Votos e eleições são meios para que o pensamento do povo se realize.Aqui se encontra a delicadeza e fragilidade da democracia: para que ela se realize é preciso que o povo saiba pensar. Se o povo não souber pensar, votos e eleições não a produzirão. A presença dos ratos na vida pública brasileira é evidência de que o nosso povo não sabe pensar, não sabe identificar os ratos... Não sabendo identificar os ratos, o próprio povo, inocentemente, abre os buracos pelos quais eles entrarão.Mas, o que é que ensina o povo a pensar? É a educação. O fundamento da democracia é a educação do povo.Os presença dos ratos na vida política brasileira, sendo evidência de que o nosso povo não sabe pensar é, assim, evidência também de que nossas instituições de educação e ensino não cumpriram a sua missão mais importante que é a de ensinar o povo a pensar. Ensinar o povo a pensar: isso não se identifica nem com a transmissão de conhecimentos e nem com a produção de pesquisas.É hora de perguntar: o que há de errado com a educação no Brasil? Se a educação não cumprir a sua missão o povo não aprenderá a pensar e estaremos condenados a conviver permanentemente com os ratos. E, infelizmente, não é possível chamar o Gordo e o Magro para tapar os buracos por onde os ratos entram... (Folha de S. Paulo, Tendências e Debates, 18/06/2001.)

Pesquisas em Educação, Pedagogia e Vestibular

Orientação Pedagógica da Educafro
Esta é uma seção que pretende oferecer aos os professores uma lista de sítios de bibliotecas que possam contribuir com as suas pesquisas e para difusão da cultura. Se você conhece algum site que não consta nessa lista.


Baixe livros e teses
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.jsp
http://www2.fpa.org.br/portal/modules/news/index.php?storytopic=1700
http://www.teses.usp.br/
http://www.zequinhabarreto.org.br/CN03/biblio_marxista/biblio_marx.asp


Site específico para o vestibular
http://www.fuvest.br/
http://www.comvest.unicamp.br/index.html
http://www.vunesp.com.br/


Baixe livros para vestibular
http://www.estudantes.com.br/bib_virt.asp


Bibliotecas virtuais
http://prossiga.ibict.br/bibliotecas/
http://sitededicas.uol.com.br/biblio.htm
http://www.unicamp.br/nipe/litera.htm


Material por disciplina
http://www.bibvirt.futuro.usp.br/textos/didaticos_e_tematicos

Sites referentes à Matemática:
www.ime.usp.br/caem
www.ime.usp.br/lem
http://pessoal.sercomtel.com.br/matematica/
http://www.rpm.org.br/
http://www.somatematica.com.br/

Sites referentes à Química
http://www.qmc.ufsc.br/

Sites referentes à Biologia
http://www.cve.saude.sp.gov.br/
www.pnud.org.br/home

Sites referentes à Física
http://www.ifi.unicamp.br/

Revista Carta Capital na escola
http://www.cartanaescola.com.br/online


Apoio ao professor
www.portaldoprofessor.mec.gov.br
www.objetoseducacionais.mec.gov.br


Universidades públicas de São Paulo
http://www.usp.br
http://www.ufabc.edu.br/
http://www.unifesp.br/
http://www.unicamp.br/
http://www.unesp.br
http://www.ufscar.br
http://www.cefetsp.br/lwp/workplace
http://www.fatecsp.br/


Testes e provas de vestibulares
http://www.fatec2007.com.br/vestibular/provas%5Fanteriores/
http://www.fuvest.br/


Institutos de pesquisa
http://www.inep.gov.br/

MEC
http://portal.mec.gov.br/index.php

Memórias burras nunca esquecem

Este texto é do grande escritor Rubem Alves.
Muitos já o conhecem. Alguns afirmam que Alves diz o óbvio.
Mesmo o óbvio, tem que ser dito por alguém.
Agradecemos a ele por isso.

É duvidoso que um professor que há anos se dedica a pesquisas de biologia molecular ainda se lembre de como resolver problemas estatísticos de genética. Também os professores dos cursinhos: cada um passaria brilhantemente na disciplina de sua especialidade. Mas também é duvidoso que um professor de português consiga resolver problemas de química ou física. Com eles, os professores que elaboram as questões que os alunos terão de responder. Para eles, vale o que foi dito sobre os professores dos cursinhos. Por fim, os diretores das empresas que preparam os vestibulares...

Essa hipótese desaforada poderia ser testada facilmente: bastaria que os personagens acima mencionados se submetessem aos vestibulares. Claro: seria proibido que se preparassem. O objetivo seria testar o que foi realmente aprendido. O que foi realmente aprendido é aquilo que sobreviveu à ação purificadora do esquecimento. O aprendido é aquilo que fica depois que o esquecimento faz o seu trabalho...

Vestibular: porta de entrada para a universidade? Seria bom se sua função se limitasse a isso. O sinistro está não no que é dito, mas no que permanece não dito: os vestibulares são um dragão devorador de inteligências cuja sombra se alonga para trás, cobrindo adolescentes e crianças.

Desde cedo, pais e escolas sabem que a escola deve preparar para os vestibulares. Os vestibulares, assim, determinam os padrões de conhecimento e inteligência a serem cultivados. Mas não existe nada mais contrário à educação que os padrões de conhecimento e inteligência que os vestibulares estabelecem.

O escritor Mário Prata escreveu uma crônica sobre as meninas jogadoras de vôlei. Era uma crônica leve, bem-humorada, picante. Era impossível não sorrir ao lê-la. Lida, ficava para sempre na memória, pois a memória guarda o que deu prazer. Passados alguns meses, ele voltou ao assunto da primeira numa crônica dirigida, se não me engano, ao então senhor ministro da Educação. É que sua primeira crônica fora usada, na íntegra, num exame vestibular.

Para um escritor, ter uma crônica transcrita, na íntegra, num exame vestibular, equivale a uma consagração. Mário Prata estava felicíssimo. Exceto por um detalhe: os examinadores, para transformar sua crônica em objeto de exame, prepararam uma série de questões sobre ela, cada uma com várias alternativas de resposta. Mário Prata resolveu, então, brincar de vestibulando. Tentou responder às questões. Não acertou uma! (Eu me saí pior do que ele. Tentei responder às questões, mas houve algumas que nem mesmo entendi!)

Se o vestibular fosse para valer, ele teria zerado no texto que ele mesmo escrevera. Ele se dirigiu, então, ao senhor ministro da Educação comentando esse absurdo. E perguntou se não teria sido muito mais inteligente se os examinadores, gramáticos, tivessem pedido que os moços escrevessem um parágrafo sobre seu artigo. Aqueles saberes esotéricos que lhes eram pedidos nunca teriam qualquer uso em suas vidas. Compreende-se que, como resultado do seu preparo para os vestibulares, os jovens passem a detestar literatura.

Minha filha queria ser arquiteta. Como não havia outro caminho, matriculou-se num cursinho. Eu a via sofrer tendo de memorizar coisas que não lhe faziam sentido. Fiquei com dó e, por solidariedade, resolvi fazer um sacrifício: passei a estudar com ela. Estudei meiose e mitose, as causas da Guerra dos Cem Anos, cruzamento de coelhos brancos com coelhos pretos... Estudei também, contra a vontade e sem interesse, a necropsia da língua chamada análise sintática. Não sei para que serve. E dizia à minha filha, à guisa de consolo: "Você tem de aprender essas coisas que você não quer aprender porque a burocracia oficial assim determinou. Mas não se aflija. Passados dois meses, quase tudo terá sido esquecido. Só sobrarão os conhecimentos que fazem sentido...". Pergunto a você, meu leitor: de tudo o que você teve de estudar para passar no vestibular, o que sobrou?

Por que nós, professores universitários, não passaríamos no vestibular? Por termos memória fraca? Não. Por termos memória inteligente. Burras não são as memórias que esquecem, mas as memórias que nada esquecem... A memória inteligente esquece o que não faz sentido. A memória viaja leve. Não leva bagagem desnecessária.

E aí eu pergunto: se nós, professores já dentro da universidade, não passaríamos nos exames vestibulares, por que é que os jovens, que ainda estão fora, têm de passar? É irracional. Especialmente em se considerando que irá acontecer com eles aquilo que aconteceu conosco: esquecerão... Haverá uma justificação pedagógica para esse absurdo? Ainda não a encontrei.

http://www2.uol.com.br/aprendiz/n_colunas/r_alves/id270303.htm